série Quintais
De galho em galho
9 de outubro de 2014 | Postado por Gabriela Romeu
É em quintais de terra vermelha, onde é quase sempre sol e a chuva demora a cair, que os meninos do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, passam seus dias. Naquelas bandas, dizer “menino” é o mesmo que dizer “criança”.
Como se não houvesse cercas, as crianças de Campo Buriti e Coqueiro Campo, comunidades da zona rural de Minas Novas e Turmalina, atravessam os quintais das casas para colher os mais variados frutos. Pulam de uma árvore para outra para colher goiaba, mangaba e murici. E, gargalhando, mostram os dentes verdes, tingidos pelo jatobá que acabaram de saborear.
Sabem bem o bioma em que vivem. “Aqui é mais para cerrado porque as árvores têm os troncos retorcidos”, diz Neidiane Gomes Barbosa Santos, 11. “No cerrado, também tem mais capim e picão, que gruda na roupa”, completa Jéssica da Silva Duarte, 11.
Camuflados nesses capins e cheios de carrapichos pelo corpo, meninos espreitam ninhos de passarinhos. “O sofreu é meu preferido. É preto, laranja e branco. Gosta de comer mamão e é triste porque não tem casa para morar”, murmura Aquilar Silva, 12.
Não é que o bicho adora ocupar os ninhos de outros passarinhos para descansar? “Tem também o joão-de-barro, que constrói sua própria casinha. Ah, e as ‘cocotas’, maritacas verdinhas, que preferem fazer ninhos em cupins abandonados, vazios”, conta Aguilar.
Logo ali perto passa o rio Jequitinhonha, que acabou virando nome de brincadeira. Camila Gomes Eduardo, 11, adora brincar de rio Jequi, uma espécie de pega-pega em que os brincantes têm que cruzar um rio de faz de conta sem ser tocado pelo pegador.
Campo Buriti e Coqueiro Campo têm esses nomes porque eram recheadas de buritis, que são coqueiros grandes e espinhosos. Agora inúmeras plantações de eucaliptos ocupam o lugar de buritis. “Cortaram muitas árvores, como o jatobá, o embiriçu, que tem flor branquinha, e pés de pequis para plantar eucaliptos”, diz Ana Maria Mendes da Silva, 12.
Texto: Marlene Peret
Foto: Samuel Macedo/Infâncias
Texto originalmente publicado no jornal Folha de S. Paulo.